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A palavra que resta em nós

rachelschwartzc

No livro “A palavra que resta”, do cearense Stênio Gardel, acompanhamos a trajetória de Raimundo, um homem analfabeto que durante a juventude teve uma paixão interrompida e guarda uma carta de seu amor por 50 anos sem poder lê-la.

Esse livro me tocou profundamente quanto a aspectos de abandono, dureza, luta contra o preconceito e a homofobia, não só de um lugar externo, mas internalizado e enraizado por sua criação.


Embora o livro não fale exatamente sobre isso, mas fico a me imaginar quantas tantas palavras nos restam em nós, aquelas que nos foram endereçadas, mas que não conseguimos e/ou não temos como ir atrás. Palavras que falam sobre quem somos, quem sonharam que seríamos, quem nos puseram expectativas sobre o que deveríamos ser. Quantas palavras poderiam nos alcançar se pudéssemos ter a força e a coragem de enfrentá-las. E será que isso bastaria?


Raimundo passa a vida imaginando o que estaria escrito nesta carta e desejando poder lê-la, mas ao mesmo tempo com medo de quem ele seria depois disso. É uma mistura de vontade e receio e isso é tão comum quando estamos falando sobre o novo. Há um antes e depois que marca o personagem, uma ruptura temporal que faz impossível manter as coisas como elas eram. Tem uma parte onde o personagem principal se indaga:


"...não tem jeito (...), a mudança vem, ou a gente correndo atrás dela ou ela atropelando a gente com tudo, sem pedir pra sair do meio. E é bom que venha mesmo, que o fim certo que é bom, é o fim certo que empurra a gente, não fosse a certeza do fim, a gente ia viver igual todo santo dia?"

Essa passagem, entre tantas outras, me chamou a atenção porque sinto que a experiência de mudança é algo que todos nós passamos. Mudar é sempre desafiador, implica em fazer algo novo e isso nos convoca a estar mais atentos ao diferente. Ali, onde nunca ocorreu pode estar nossos mais terríveis medos e também desejos profundos. Um lugar diferente e não, não digo somente de forma geográfica, faz com que nos sintamos vivos. Afinal, a vitalidade mora no movimento.


Eu acredito que os livros são a forma que temos de viajar e nos teletransportar para personagens e vivências que não são parecidas com as nossas, mas, ao mesmo tempo, você consegue sentir como o personagem se sente. Ler, pra mim, é ampliar a minha visão de mundo, é um descanso que me nutre.




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